segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Acalanto ao pobre apaixonado

Ariosvaldo, era um homem feliz.
Casado com o trabalho, termo engomado, sapato lustrado. Acordava o galo por todos os dias, numa extrema rotina que aos olhos e ouvidos dos outros talvez levasse ao macio divã.
Ariosvaldo era um homem misterioso, cheio de manias, por exemplo costumava dormir todos os dias com o mesmo cobertor, e sempre na mesma posição, virado para a esquerda, de fronte à parede.
Sua vida não era uma grande aventura, muito menos uma grande emoção. Não tinha muitos amigos, não saia de casa, deitava cedo, enfim, a vida que quase ninguém desejava.
Eu já disse que Ariosvaldo era um certo candidato ao divã ? Sim, pois sim eu disse. Nem os pais, nem os amigos nem os vizinhos, viam-o. Alguns suspeitavam que ele andava morto faz tempo, outros que ficou louco, ou se internou, mas não, não é que o dito cujo de defunto ou de louco nada tinha.
Ari como era chamado pelos pais, morava no sétimo andar de um antigo prédio no centro de Horizonte Belo, bem perto de onde um dia se ouviu todos os Nascimentos, Borges, Guedes, Venturinis.
De sons sim, isso o rapinante entendia bem, também me recorda, do dia em que ele saiu de casa, levantou pegou as coisas e foi embora. Claro que por uma daquelas.
Ele nem se despediu, simplesmente foi embora, deixaste-me aqui com esse nó no estômago e com missão de contar alguém sobre o segredo de Ariosvaldo.
Seria segredo se ninguém o soubesse, mas qual seria a graça de não poder contar para ninguém. Pensei bem e resolvi escrever-lhe aqui caro amigo, simplesmente porque acho que alguém além de mim deveria saber disso, ainda mais agora que o Ari se foi e só fiquei.
Bem de ódio deve estar, de tanto falar, de tanto enrolar, tão chato fiquei. Muito que bem, o segredo de Valdo, é que aquele louco homem enamorou-se por uma daquelas, uma esmeralda, não a mulher e sim a pedra. E cada canto que se esgueirava, só pensava na beleza daquelas esferas verdes.
Tamanha loucura, que comprou uma maquina de escrever, e escreveu, por cada momento, tentou colocar dentro de cada palavra, um recado diferente à esmeralda. Milhares de palavras, milhares de letras, de rabiscos, tudo formava uma história perfeita. Talvez para todos menos para o pobre rapaz.
Para você que não sabia o segredo de Ariosvaldo consistia em não poder falar. Por mais que escrevesse, ele não poderia pronunciar à querida nem uma misera palavra.
A frustração foi tamanha que queimou todos os papeis, destruiu a maquina de escrever, chorou, gritou mesmo sem poder falar.

E se foi, apenas foi, deixando ali na esperança de que um dia aquelas lindas pedras, como olhos verdes da amada pudessem ler, um conjunto de rabiscos num papel maltrapilho deixado à merce.

" Pedra querida, que me trouxesse alegria de viver, tamanha era euforia, de pensar nos olhos teus a cada dia, que me esqueço de sofrer.

E se espero a entrada de vosmecê, por aquela porta, tão deslumbrante em meus braços, a dor é imensa por não poder te dizer o que meramente seria dizer, o quanto em meu peito a chama inflama.
Despeço-lhe no entanto com tristeza em meus olhos, que esses dizem a vós o quanto grato a ti serei."


E dizem por aí as más línguas, que Ariosvaldo, velho homem, que de velho não tinha nada, se tornou um bardo, a tentar fazer com que as palavras que não saiam de sua boca, tocassem os olhos dos pobres enamorados, podendo assim, vingar o seu pobre destino, mas a vingança de amar.

 

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A semana

"Velhos hábitos, velhas lembranças
Recordam você,
percebo a cada dia que a vida é mais
e mais que tudo já feito,
falado, sentido.
E sigo em frente com a cabeça erguida,
orgulho, e um novo amor, aquele a mim mesmo.

Se sobrevivi a tanta pressão,
foi por meus próprios passos.
Nem nada, nem tudo será eterno.

A cada fracasso, a cada súplica
a cada lágrima.

Pensei em desistir.

E lá trás ela ficou,
um sorriso esbelto
tomava conta do meu ser.

E o grande fracasso
seria fracassar
na jornada da autoaprovação.

E sim, após tudo e todos
hoje serei feliz." 

domingo, 24 de julho de 2011

Arcano

E mal  olhavam-se, toda a cumplicidade terminara enfim. A guerra entre os olhares, transformava o clima quente do desjejum, em um gélido funeral. O muito que havia a ser dito, estaria preso aos gestos da noite anterior. Todas as palavras cobriam  tal sala como a neblina de manhas frias.
Rompe-se o silêncio então com um por que de voz masculina. E nesse momento tal beleza do rosto dela, se afogava em lágrimas. Ele levanta e se vai, sabendo que ali não deveria mais pisar. Banhou-se, arrumou as malas, tornou-se até a mesa onde encontrara aquela que não reconhecia mais, derramou ali o molho velho de chaves, e apenas partiu, carregando consigo o velho por que.
Ao entrar no carro, não sabia o que fazer, apesar de tudo não queria deixá-la, momentos onde foi enganado, mas era feliz. Dirigiu horas, dias, noites. Tudo parecia-lhe um mau sonho, porém quando acordou, não se reconhecera mais.
À beira da estrada abandonada, retirou da carteira uma foto surrada e amarelada pelo tempo. Pôs-se enfim a chorar, memorias de tempos felizes. Olhou para trás e concluiu, era  hora de voltar, deveria saber toda verdade. E mais uma vez dirigiu, contudo sabendo agora qual teu destino.
Parou em frente ao portal, nada aparentava estar mudado. Então viu pela janela a figura de um homem. Suas mãos gelaram, em teu peito parecia bater mais de um coração. Por dúzias de minutos, permanecera ali estático, não sabia se queria entrar, enfrentar tal situação.
Por um reflexo no espelho da sala vira teu melhor amigo parado ali na posição que deveria ser sua. Recordou então de um velho revolver, herança do avô, que ficava na garagem.
Subindo as escadas até seu quarto, só pensara na vontade de entregá-la ao mesmo destino do amigo, coberto de sangue e pela surdez de teu ódio.Parou defronte à porta do quarto, analisava a unica bala que lhe restara, bala essa que representou teu orgulho pouco tempo atrás.
Já dentro do quarto, viu por entre um laço em lençois o corpo gélido de sua amada. Nesse momento o pranto e desespero tomaram lugar do ódio. Abaixou-se e recolheu um bilhete de letras miudas que nenhum outro leitor saberia o significado daquelas palavras. e repetindo-as em voz alta, deu destino ao solitário projétil. " Era com você."

terça-feira, 19 de julho de 2011

Cotidiano

"Acordou, levantou
Banhou, trocou
Correu, perdeu
Cansou, chegou
Ouviu, sentou
Suspirou, trabalhou
Almoçou, descansou
Caminhou, voltou
Continuou, cansou
Acabou, pensou
'Mais um dia que se vai' " (Felipe Jardim)

O Escritor

"Escrevia noite e dia
noite, dia a sofrer.
Em tal esperança vadia
o desejo de viver.

Pernoitava em seus versos
em seus versos deleitava.
E nos sonhos tão dispersos
sua alma acalmava.

E no raiar da nova aurora
os desejos que restavam
eram retornar a outrora." (Felipe Jardim)

Indigente

"E era formosa como a lua
os dias defrontavam teu olhar
e nada lhe era dito

Toda tristeza dos antigos versos
ou noites de luar
tudo fora-lhe tirado

Não sabia mais quem era
nem teu cheiro, nem teu gosto
nada resumia mais a aventura
que fora viver." (Felipe Jardim)

A Flor



Certo dia resolvi comprar uma flor, mas não qualquer flor, era a mais linda das flores, contudo, essa flor só era cultivada em um país muito distante, e eu não poderia compra-la sendo uma beleza rara, os habitantes não pretendiam vende-la. 
Apesar de todos os empecilhos parti à terra desconhecida. No caminho muitos desafios, muito frio e longa distância, porém, a solidão foi o pior inimigo. 
Chegando aquele lugar esquecido por Deus o medo tomava conta do meu ser, já que nada ali soava, nem parecia familiar. Começava assim minha busca. 
Já possuía o mapa para encontra-la, então em meio a toda aquela selva atônita, meti-me diante todos os desafios, foi confuso, difícil e um grande exercício da paciência, esperar horas e horas, até avistá-la. 
Até que então, quando a vi, meus olhos enamoravam a beleza de tuas pétalas, simples e maravilhosas, teu perfume enfeitava-me cada segundo mais, deleitávamos o momento e a ideia de como fora tardio esse encontro. 
Precisara eu voltar ao abrigo àquela selva a noite não me era um lugar seguro. Então com a onda e o fervor do momento colhi a flor e a levei comigo até meu abrigo. 
O meu amor por aquele ser era tão grande que passei a noite a admirá-la, idolatra-la, que acabei esquecendo-me de regá-la, de cuidar para que sobrevivesse. E assim a mais bela das rosas se foi. 
Desolado, não soube o que fazer, o desespero tomava-me por completo, então dois nativos, que mais pareciam os bons samaritanos das parábolas bíblicas, ou até mesmo anjos, consolavam-me e levantavam-me de tamanha tristeza, mesmo assim ainda permaneci na selva, sozinho, no frio, sendo roubada minha comida e sustento por predadores da noite. 
A falta de tamanha musa fez-me apanhar aquele velho e surrado mapa mais uma vez,  e partir a tal busca. Apontei todos os possíveis lugares onde encontra-la, e novamente parti. 
O primeiro lugar era um jardim gigante, dentro daquela relva. Encontrei todos os tipos de flores, menos a minha amada. Esperançoso, caminhei para o segundo possível local, um pequeno vilarejo, mas, nada, ela não brotara ali. 
O terceiro era minha ultima chance, uma tribo bem próxima ao segundo vilarejo, uma tribo onde todas as etnias se encontravam através de seus sábios. Africanos, caucasianos, latinos, confirmavam minhas expectativas, a mais bela das flores, floresceria ali, mas iria demorar certo tempo. 
Meses se passaram e eu continuava ali diante as mais belas e sábias almas que conheci. Tratavam-me da melhor maneira, exaltavam a vontade no meu coração de revê-la, compartilhavam minhas expectativas e esperanças e torciam pelo meu êxito. 
Chegara assim a tarde em que desabrocharia novamente aquele amor. Da mesma forma ela reapareceu linda e esplêndida como antes. Todos os olhares e expectativas eram a nós, corações esperançosos pulavam de todos os lados. 
Era a hora de me aproximar, estendi minhas mãos para alcança-la, tinha a certeza de não cometer os mesmos e primeiros erros. Entretanto não percebi, e havia muitos espinhos, grandes navalhas que me cortaram. Surpreso com sangue que escorria por entres meus dedos, perdi por alguns instantes. “o que aconteceu?” – pensava a todo o momento – “por que me rejeitara, ó formosa flor? 
A vontade de tê-la, aumentava potencialmente, a ponto de jogar meu corpo à ela, grande erro. Teus espinhos já se tornavam tão grandes e resistentes que perfuraram meu peito. Vendo tal situação todos aldeões prontificaram-se a me ajudar, fecharam as feridas, mas a tristeza, essa permanecera ali, forte e aguda como todos aqueles espinhos. 
Nada restava a mim ali em tal lugar mais, precisava voltar para casa, despedi-me de cada um daquele lugar, sendo eu eternamente grato a todos eles por tudo. E da flor, apenas guardarei e nunca me esquecerei de tamanhos momentos, apesar de curtos os mais felizes de minha vida.

Prólogo de um fracasso ?

"O escritor é um homem que mais do que qualquer outro tem dificuldade para escrever." (Thomas Mann)

"Escrevo meramente para escrever,
mas escrevendo eu penso
Pensando me recordo
Se já diziam recordar é viver.

Logo escrever é viver.


Deixo aqui a você quem quer que seja, um pouco das minhas madrugadas, noites em claro, ou até mesmo suspiros de algumas lembranças.
Julgais, pois assim sabereis até onde atingiram minhas palavras." (Felipe Jardim)