domingo, 24 de julho de 2011

Arcano

E mal  olhavam-se, toda a cumplicidade terminara enfim. A guerra entre os olhares, transformava o clima quente do desjejum, em um gélido funeral. O muito que havia a ser dito, estaria preso aos gestos da noite anterior. Todas as palavras cobriam  tal sala como a neblina de manhas frias.
Rompe-se o silêncio então com um por que de voz masculina. E nesse momento tal beleza do rosto dela, se afogava em lágrimas. Ele levanta e se vai, sabendo que ali não deveria mais pisar. Banhou-se, arrumou as malas, tornou-se até a mesa onde encontrara aquela que não reconhecia mais, derramou ali o molho velho de chaves, e apenas partiu, carregando consigo o velho por que.
Ao entrar no carro, não sabia o que fazer, apesar de tudo não queria deixá-la, momentos onde foi enganado, mas era feliz. Dirigiu horas, dias, noites. Tudo parecia-lhe um mau sonho, porém quando acordou, não se reconhecera mais.
À beira da estrada abandonada, retirou da carteira uma foto surrada e amarelada pelo tempo. Pôs-se enfim a chorar, memorias de tempos felizes. Olhou para trás e concluiu, era  hora de voltar, deveria saber toda verdade. E mais uma vez dirigiu, contudo sabendo agora qual teu destino.
Parou em frente ao portal, nada aparentava estar mudado. Então viu pela janela a figura de um homem. Suas mãos gelaram, em teu peito parecia bater mais de um coração. Por dúzias de minutos, permanecera ali estático, não sabia se queria entrar, enfrentar tal situação.
Por um reflexo no espelho da sala vira teu melhor amigo parado ali na posição que deveria ser sua. Recordou então de um velho revolver, herança do avô, que ficava na garagem.
Subindo as escadas até seu quarto, só pensara na vontade de entregá-la ao mesmo destino do amigo, coberto de sangue e pela surdez de teu ódio.Parou defronte à porta do quarto, analisava a unica bala que lhe restara, bala essa que representou teu orgulho pouco tempo atrás.
Já dentro do quarto, viu por entre um laço em lençois o corpo gélido de sua amada. Nesse momento o pranto e desespero tomaram lugar do ódio. Abaixou-se e recolheu um bilhete de letras miudas que nenhum outro leitor saberia o significado daquelas palavras. e repetindo-as em voz alta, deu destino ao solitário projétil. " Era com você."

terça-feira, 19 de julho de 2011

Cotidiano

"Acordou, levantou
Banhou, trocou
Correu, perdeu
Cansou, chegou
Ouviu, sentou
Suspirou, trabalhou
Almoçou, descansou
Caminhou, voltou
Continuou, cansou
Acabou, pensou
'Mais um dia que se vai' " (Felipe Jardim)

O Escritor

"Escrevia noite e dia
noite, dia a sofrer.
Em tal esperança vadia
o desejo de viver.

Pernoitava em seus versos
em seus versos deleitava.
E nos sonhos tão dispersos
sua alma acalmava.

E no raiar da nova aurora
os desejos que restavam
eram retornar a outrora." (Felipe Jardim)

Indigente

"E era formosa como a lua
os dias defrontavam teu olhar
e nada lhe era dito

Toda tristeza dos antigos versos
ou noites de luar
tudo fora-lhe tirado

Não sabia mais quem era
nem teu cheiro, nem teu gosto
nada resumia mais a aventura
que fora viver." (Felipe Jardim)

A Flor



Certo dia resolvi comprar uma flor, mas não qualquer flor, era a mais linda das flores, contudo, essa flor só era cultivada em um país muito distante, e eu não poderia compra-la sendo uma beleza rara, os habitantes não pretendiam vende-la. 
Apesar de todos os empecilhos parti à terra desconhecida. No caminho muitos desafios, muito frio e longa distância, porém, a solidão foi o pior inimigo. 
Chegando aquele lugar esquecido por Deus o medo tomava conta do meu ser, já que nada ali soava, nem parecia familiar. Começava assim minha busca. 
Já possuía o mapa para encontra-la, então em meio a toda aquela selva atônita, meti-me diante todos os desafios, foi confuso, difícil e um grande exercício da paciência, esperar horas e horas, até avistá-la. 
Até que então, quando a vi, meus olhos enamoravam a beleza de tuas pétalas, simples e maravilhosas, teu perfume enfeitava-me cada segundo mais, deleitávamos o momento e a ideia de como fora tardio esse encontro. 
Precisara eu voltar ao abrigo àquela selva a noite não me era um lugar seguro. Então com a onda e o fervor do momento colhi a flor e a levei comigo até meu abrigo. 
O meu amor por aquele ser era tão grande que passei a noite a admirá-la, idolatra-la, que acabei esquecendo-me de regá-la, de cuidar para que sobrevivesse. E assim a mais bela das rosas se foi. 
Desolado, não soube o que fazer, o desespero tomava-me por completo, então dois nativos, que mais pareciam os bons samaritanos das parábolas bíblicas, ou até mesmo anjos, consolavam-me e levantavam-me de tamanha tristeza, mesmo assim ainda permaneci na selva, sozinho, no frio, sendo roubada minha comida e sustento por predadores da noite. 
A falta de tamanha musa fez-me apanhar aquele velho e surrado mapa mais uma vez,  e partir a tal busca. Apontei todos os possíveis lugares onde encontra-la, e novamente parti. 
O primeiro lugar era um jardim gigante, dentro daquela relva. Encontrei todos os tipos de flores, menos a minha amada. Esperançoso, caminhei para o segundo possível local, um pequeno vilarejo, mas, nada, ela não brotara ali. 
O terceiro era minha ultima chance, uma tribo bem próxima ao segundo vilarejo, uma tribo onde todas as etnias se encontravam através de seus sábios. Africanos, caucasianos, latinos, confirmavam minhas expectativas, a mais bela das flores, floresceria ali, mas iria demorar certo tempo. 
Meses se passaram e eu continuava ali diante as mais belas e sábias almas que conheci. Tratavam-me da melhor maneira, exaltavam a vontade no meu coração de revê-la, compartilhavam minhas expectativas e esperanças e torciam pelo meu êxito. 
Chegara assim a tarde em que desabrocharia novamente aquele amor. Da mesma forma ela reapareceu linda e esplêndida como antes. Todos os olhares e expectativas eram a nós, corações esperançosos pulavam de todos os lados. 
Era a hora de me aproximar, estendi minhas mãos para alcança-la, tinha a certeza de não cometer os mesmos e primeiros erros. Entretanto não percebi, e havia muitos espinhos, grandes navalhas que me cortaram. Surpreso com sangue que escorria por entres meus dedos, perdi por alguns instantes. “o que aconteceu?” – pensava a todo o momento – “por que me rejeitara, ó formosa flor? 
A vontade de tê-la, aumentava potencialmente, a ponto de jogar meu corpo à ela, grande erro. Teus espinhos já se tornavam tão grandes e resistentes que perfuraram meu peito. Vendo tal situação todos aldeões prontificaram-se a me ajudar, fecharam as feridas, mas a tristeza, essa permanecera ali, forte e aguda como todos aqueles espinhos. 
Nada restava a mim ali em tal lugar mais, precisava voltar para casa, despedi-me de cada um daquele lugar, sendo eu eternamente grato a todos eles por tudo. E da flor, apenas guardarei e nunca me esquecerei de tamanhos momentos, apesar de curtos os mais felizes de minha vida.

Prólogo de um fracasso ?

"O escritor é um homem que mais do que qualquer outro tem dificuldade para escrever." (Thomas Mann)

"Escrevo meramente para escrever,
mas escrevendo eu penso
Pensando me recordo
Se já diziam recordar é viver.

Logo escrever é viver.


Deixo aqui a você quem quer que seja, um pouco das minhas madrugadas, noites em claro, ou até mesmo suspiros de algumas lembranças.
Julgais, pois assim sabereis até onde atingiram minhas palavras." (Felipe Jardim)